Um trabalho de equipe

Obs: Essa história foi contada pela Pomba Gira Maria Padilha da 7 Encruzilhadas do Centro Espiritualista Caboclo Pery (Niterói/RJ), para explicar algumas dinâmicas do trabalho. Os personagens dessa história receberam nomes fictícios.
 
Carlos  vai ao  Centro aconselhado  por  um  amigo, pois a sua  vida está complicada. Sua mãe vive doente, tendo ido a diversos médicos sem sucesso na cura. Seu pai foi demitido da empresa que trabalhava por mais de 25 anos, vive deprimido. Ele está desempregado há três anos, vê o filho adoecer sem condições de comprar medicamento. Sua esposa, única ainda empregada, apresenta indícios de fadiga mental e física.
Ao chegar no centro descobre que é dia de consulta com Preto Velho. O seu amigo vai explicando a rotina da casa e como ele deve agir e pedir na hora da consulta.
Chega  finalmente a sua vez, o seu pensamento está cheio de dúvidas, achando que chegou ao fundo do poço por ter ido a um terreiro de macumba, falar com uma  pessoa que nunca viu antes na vida e abrir o seu coração. 

Num primeiro momento acha graça da posição do médium todo curvado e do jeito de falar, mas o Preto Velho vai aos pouquinhos ministrando alguns passes e por  fim Carlos começa a se abrir.
O Preto Velho a tudo ouve, manifestando de tempos em tempos palavras encorajadoras para o aflito Carlos.
Carlos não entende o por que, mas enquanto ele fala, o Preto Velho vai estalando os dedos em volta dele, olha discretamente para o copo d’água ao lado da vela, joga para cima a fumaça de seu cachimbo, e assim vai firmando e passando as informações para os guardiões que pertencem a egrégora
1/ da Casa, que através dos Exus de trabalho partem para a casa de Carlos.
Diz no final da consulta que irá  trabalhar para ele e toda a sua família, dá algumas recomendações sobre como rezar e elevar o pensamento a Deus e se despedem.
Carlos tem alguma sensação de alívio, sente-se mais leve e confiante, mas ao mesmo tempo não acredita que meia dúzia de estalar de dedos vão “resolver” o seu problema... Incrédulo, mas não tão fraco retorna a sua casa sem nem imaginar que a batalha está apenas começando.
O Preto Velho ao ver Carlos se levantar e ir embora sabe que a essa altura toda a
egrégora1/ da Casa já está se preparando para a batalha.
Com o término dos trabalhos, os médiuns começam a ir embora e pensam: “A gira terminou.”
Não meus caros, a “gira” está apenas começando.

egrégora1/ da Casa está  reunida no terreiro aguardando o retorno dos Exus de Trabalhos com as informações de cada consulta realizada.
Os Exus vão retornando, um a um.
O Mentor da Casa assiste e faz intervenções quanto às deliberações do Alto, e os Chefes de Linha  estabelecem o famoso  “quem vai fazer o que”. Tudo isso ocorre em ambiente absolutamente harmônico e organizado.
Exus, Caboclos e Pretos Velhos trocam impressões a respeito dos problemas apresentados e deliberam.
Mas,  voltando ao nosso amigo  Carlos.
Quando  Exu  Marabô  retorna com  as  informações  a  respeito do que  encontrou na casa de Carlos, o diálogo que se dá é o seguinte:

- Marabô: É, Pai Benedito, a situação lá está bem complicada.

- Pai Benedito: Eu já suspeitava. O que você viu?

- Marabô: A  casa do  moço Carlos foi  totalmente  absorvida  por uma rede de energia que tem seres grotescos mantendo-a firme. Segui buscando a origem dessa rede e me deparei com uma construção logo acima da casa. Dentro vi uma inteligência poderosa, mas sem relação direta com nenhum dos envolvidos. Buscando entender a “trama” continuei procurando o porque daquilo e encontrei uma mulher bastante  dementada, com um aparelho  acoplado em  sua  nuca  e pude “ler” seus pensamentos e “sentir” seus desejos de vingança para com o pai carnal do moço Carlos. Vi também que eles ainda não sabem que o moço Carlos veio aqui no terreiro.
Bem, em resumo: A inteligência envolveu essa pobre infeliz e prometendo-lhe “devolver” o pai do moço Carlos para ela e suga suas energias que é retro-alimentada pelo sentimento de culpa que o pai do moço Carlos tem. Parece que foi uma aventura da juventude dele, não me preocupei em saber se desta ou de outra  vida,  pois  achei  que  os dados  que  tinha  já  eram  suficientes  para podermos trabalhar.
- Pai  Benedito: Sim,  sim...  Mais  do  que  suficientes!  Não  estamos  aqui  para  julgar  ninguém. Isso cabe ao Pai. 

- Bem, nesse caso teremos que destruir essa construção, mas precisamos primeiro recuperar a moça, e já que o pai de Carlos está involuntariamente retro-alimentando a construção, precisaremos de recursos para auxiliar os familiares também.
Assim,  Pai  Benedito  se  dirige  ao  Caboclo  Flecha  Dourada,  responsável  pela  corrente  de desobsessão daquele terreiro e expõe a situação. 
Imediatamente o Caboclo determina que a Pomba Gira Figueira irá utilizar os seus elementos magísticos para que a equipe de resgate da Casa recupere a moça e quem mais tenha condições de tratamento e a “equipe de força” destrua a construção e todos os equipamentos dentro dela. 
Tarefas distribuídas, eles partem para a construção.
Caboclos, Pretos Velhos e Exus guardam uma certa distância da construção e observam a Pomba Gira Figueira assumir uma configuração praticamente transparente. 
Ao  chegar perto da construção percebe-se sair de sua boca uma espécie de  fumaça enegrecida que começa a tomar conta do ambiente. Logo atrás dela, homens empurram uma espécie de carrinho, que lembram os carrinhos usados em minas de escavação de carvão.
Conforme a Sra. Figueira vai entrando no ambiente tomado por essa fumaça negra, os seres que  lá  estão  caem  em  profundo  sono,  sendo  resgatados  pelos  homens  e  colocados  dentro  dos carrinhos. A ação dela é rápida. Ninguém percebe a sua presença.
Quando todos são resgatados, a Sra.  Figueira começa a manipular a energia dos instrumentos dentro da construção mudando sua forma, plasmando outras energias e transformando os instrumentos em bombas auto-destrutivas.
Finalmente sai da construção e os Exus que compõe a “tropa de choque” ou “equipe de força” passam a detonar a bomba e a destruir a construção e a malha que envolve a construção material na Terra e a prender os seres grotescos que dão sustentação a malha no ponto da construção material.
Caboclos  e  Pretos  Velhos  começam  a  tratar  ali  mesmo  as  inteligências  retiradas  da construção, colocando-os em macas e direcionando aos locais adequados aos tratamentos que irão receber, sob os olhos atentos dos Exus Guardiões, Amparadores e de Trabalho.
Outros  partem  para  a  construção  material  e  começam o  trabalho  individualizado  entre  os membros  da família. Exus  fazem  o trabalho  de  limpeza  e  descarga, resgatando  os  “perdidos”,  para serem  encaminhados  para  os  trabalhos  de  desobsessão  da  Casa  de  Umbanda,  abrindo  espaço  e
dando  condições  vibratórias  para  o  trabalho  dos  Caboclos  e  Pretos  Velhos  que  é  o  de  inspirar pensamentos de perdão ao pai de Carlos, de esperança no próprio Carlos, saúde e bons eflúvios na esposa  e  mãe  de  Carlos.  Através  de  passes  magnéticos  Caboclos  e  Pretos  Velhos  transformam  o campo vibratório da casa e cuidam de seus moradores.
Enquanto tudo isso ocorre a casa dorme, e todos são tratados em espírito.
Enquanto  isso  os  médiuns  daquele  terreiro  também  dormem  em  suas  casas,  mas  alguns estão  doando  ectoplasma,  auxiliando  nos  trabalhos  de  transmutação  energética.  Uns  participando ativamente  e outros observando e aprendendo, através do  processo de desdobramento,  assistem a boa parte dos trabalhos.
Após o trabalho realizado o Mentor da Casa sorri.
É  claro  que todos  sabem  que  de  agora  em  diante  é  de  acordo com  o merecimento  de  cada um, de cada membro dessa família, tudo dependerá do quanto cada um irá lutar para melhorar, mas agora sem as “amarras” ou interferência do Astral Inferior. 
A  Umbanda  através  de  uma  ação  conjunta  dos  componentes  da 
egrégora1/ de  uma  Casa  de Umbanda pôde proporcionar alívio, conforto e libertação aos membros da família e auxílio aos irmãos perdidos nas trevas da ignorância, do ódio, do rancor, do remorso e da culpa. 
Mesmo  que  Carlos  nunca  mais  volte  ao  terreiro  para agradecer  a  melhora,  ou  que  nunca desperte para a ajuda que recebeu, mesmo que o pai de Carlos nunca se perdoe, a Umbanda se fez presente em Caridade e Amor!

 

1/ EGRÉGORA provém do grego “egrégoroi” e designa a força gerada pelo somatório de energias físicas, emocionais e mentais de duas ou mais pessoas, quando se reúnem com qualquer finalidade.